Cumplicidades da Igreja <br>na destruição da identidade social

Jorge Messias

«Só a for­tuna da Igreja acu­mula mais di­nheiro que o das mai­ores em­presas do mundo e, cer­ta­mente, possui muito mais do que a grande mai­oria dos países do pla­neta. Pro­va­vel­mente, com o di­nheiro que con­trola, poder-se-ia até acabar com boa parte ou mesmo com a fome em todo o mundo. Mas os papas ja­mais per­mi­tirão que essas verbas sejam do­adas a ou­tros porque, no fim de contas, elas são es­sen­ciais ao Va­ti­cano para manter o seu pró­prio es­ta­tuto...» (Alex Ro­dri­gues, “O lado oculto da Igreja”).

«As par­ce­rias com as IPSS são fun­da­men­tais. Porque o Es­tado não pode ab­dicar de muitas das suas res­pon­sa­bi­li­dades, mas para as ga­rantir, tem de se saber li­bertar da­quelas que ou­tros prestam de forma mais efi­ci­ente. Foi criado para as IPSS um Plano de Emer­gência com um or­ça­mento de 630 mi­lhões de euros que ma­xi­mizam as ca­pa­ci­dades ins­ta­ladas em lares e cre­ches ca­tó­licos e ga­rantem aos seus utentes duas re­fei­ções diá­rias com­pletas, por pessoa» (Mota So­ares, mi­nistro da Se­gu­rança So­cial, 27.4.2013, num co­ló­quio do Banco Mil­le­nium BCP).

«À pri­meira vista, a mer­ca­doria pa­rece uma coisa sim­ples, tri­vial e evi­dente; porém, ana­li­sando-a, vê-se como é com­pli­cada, do­tada de sub­ti­lezas me­ta­fí­sicas e de dis­cus­sões te­o­ló­gicas» (Karl Marx, “O Ca­pital”, ca­pí­tulo I, livro 4).

Fala-se em crise ca­pi­ta­lista e logo se su­gere que não há di­nheiro. Nada é mais falso do que tal afir­mação. Os bancos atra­vessam ale­gre­mente as suas ale­gadas di­fi­cul­dades prin­ci­pes­ca­mente pagas pelo Es­tado e pelos fundos eu­ro­peus. Tal como acon­tece com os lu­cros dos grandes grupos fi­nan­ceiros.

Ga­nham os ricos, perdem os po­bres. Enoja olhar nas es­ta­tís­ticas como au­mentam os ní­veis de de­gra­dação da vida do povo. Como se des­mo­ronam a eco­nomia, o en­sino, o Sis­tema Na­ci­onal de Saúde e a Se­gu­rança So­cial. Mas não é só de crise fi­nan­ceira que se trata. É, também, de sub­versão. Os alvos vi­sados são os di­reitos e li­ber­dades dos ci­da­dãos. O fi­gu­rino a impor é o da Nova Ordem Mun­dial.

Não nos ve­nham dizer que os na­zismos são arcas en­coi­radas do pas­sado. O nazi-fas­cismo existe e ga­lopa no sen­tido da to­mada do Poder.

A nível hi­e­rár­quico, o Va­ti­cano co­nhece esta si­tu­ação me­lhor do que nin­guém. Sabe que as troikas são agentes do crime so­cial e não as de­nuncia nem com­bate. E não é que tenha ilu­sões acerca da mons­truosa men­tira que in­voca a falta de di­nheiro para tentar jus­ti­ficar o de­sem­prego, a mi­séria ou a falta dos bens es­sen­ciais às mul­ti­dões dos po­bres e so­ci­al­mente dé­beis. Um dos cú­mulos do ri­dí­culo é ad­mitir-se, se­quer, que os papas são po­li­ti­ca­mente in­gé­nuos ou ig­no­rantes. Não pode nem deve es­quecer-se que foram os re­centes pon­tí­fices ca­tó­licos que apoi­aram a cri­ação de um go­verno único mun­dial e de uma cen­tral ban­cária uni­fi­cada, en­quanto cons­troem em todo o mundo, sob a capa hi­pó­crita da Ca­ri­dade, do Ecu­me­nismo e da Jus­tiça So­cial, uma malha gi­gan­tesca de par­tilha com os mo­no­pó­lios de uma ti­rania uni­versal.

O alto clero bem sabe que o que se passa em Por­tugal es­pelha o que acon­tece no resto da Eu­ropa. Em tempo de vacas gordas, os ne­o­ca­pi­ta­listas apoi­aram a es­pe­cu­lação, ainda que à custa do des­man­te­la­mento da eco­nomia, mesmo que pri­vada. Só se ape­lava ao con­su­mismo e à aqui­sição do su­pér­fluo em pre­juízo do es­sen­cial. A so­ci­e­dade, com graves culpas para uma Igreja cor­rupta que se en­volveu numa teia de es­cân­dalos, passou a ab­solver sis­te­ma­ti­ca­mente os crimes co­me­tidos pelos po­de­rosos. O que im­porta é pos­suir di­nheiro sem se olhar a normas ou a tabus. É este o ver­da­deiro sen­tido da Te­o­logia da Pros­pe­ri­dade ou da Nova Era que se con­funde com a Nova Ordem do grande ca­pital.

Através da troika, o ca­pi­ta­lismo mun­dial em­prestou a Por­tugal, a juros al­tís­simos e em 2011, 78 mil mi­lhões de euros dos quais, se­gundo os termos do con­trato, 12 mil mi­lhões fi­caram desde logo ca­tivos para re­ca­pi­ta­li­zação dos bancos pri­vados. Esta cláu­sula, acu­mu­lada com os va­lores es­ma­ga­dores (7%) dos juros a pagar aos cre­dores agi­otas de quem o País se tornou de­vedor, de­ter­minou de­pois os cortes cri­mi­nosos que não cessam de es­magar os tra­ba­lha­dores e o povo por­tu­guês. Sa­cri­fí­cios que passam ao lado da banca, das mai­ores for­tunas, dos ac­ci­o­nistas dos grandes grupos em­pre­sa­riais e da Igreja, esta pro­te­gida como está pelos jogos si­len­ci­osos das isen­ções, dos sub­sí­dios, das par­ce­rias, das fun­da­ções e, acima de tudo, pelo muro in­trans­po­nível que a Con­cor­data ga­rante aos seus ne­gó­cios sub­ter­râ­neos.




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